
EP#48: Narrativas intransigentes na regulação de IA
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A instalação da Comissão Especial na Câmara dos Deputados para analisar o Projeto de Lei 2338/2023 — que estabelece princípios, direitos e deveres para o desenvolvimento e uso responsável da inteligência artificial no Brasil — reaqueceu uma série de narrativas intransigentes que têm marcado os debates públicos e políticos sobre regulação tecnológica. Esses discursos, em muitos casos, desvirtuam o conteúdo do projeto e dificultam a construção de consensos mínimos sobre a urgência de um marco legal claro e democrático para a IA no país.
É possível identificar, com base nas audiências públicas, em comunicados de entidades do setor e nas redes sociais de parlamentares e influenciadores, três grandes grupos narrativos que têm dominado os espaços de disputa: (1) narrativas econômico-liberais contra regulação, (2) narrativas ideológicas associando regulação à censura, e (3) narrativas que minimizam os riscos relacionados à proteção de dados.
A primeira e uma das narrativas mais difundidas parte de setores empresariais e de representantes do setor tecnológico que afirmam, de forma categórica, que qualquer tentativa de regular a IA neste momento comprometerá a inovação e o desenvolvimento do país. Essa tese se expressa em formulações recorrentes como: “O PL 2338 impõe encargos que podem barrar a inovação.”; “A governança proposta é excessiva.”; “A intervenção da ANPD poderá afastar investimentos e sufocar startups.”; “O mercado se autorregula melhor.”
A crítica mais estruturada a essa narrativa tem vindo de economistas, juristas e especialistas em direitos digitais, que lembram que setores como saúde, aviação e finanças são altamente regulados e, ainda assim, inovadores. Como ironizou o instituto Data Privacy Brasil, essas justificativas formam uma “ladainha típica de lobistas anti-regulação”, baseada em mitos não sustentados empiricamente.
Outro conjunto de narrativas que tem contaminado o debate gira em torno da suposta intenção do projeto de censurar vozes conservadoras e de institucionalizar um “controle ideológico” das tecnologias. Essa linha discursiva, amplamente disseminada por influenciadores da extrema-direita e por parlamentares de oposição, costuma associar o PL 2338 a um projeto mais amplo de “censura digital”, ainda que o texto do projeto não trate de moderação de conteúdo nem regule redes sociais.
Um terceiro eixo narrativo opera por meio da relativização dos riscos associados à coleta e ao uso massivo de dados pessoais para treinar sistemas de IA. Ainda que não seja amplamente vocalizada em discursos oficiais, essa narrativa circula com frequência em bastidores parlamentares e ambientes técnicos pouco sensíveis à agenda de proteção de dados. A ideia subjacente é simples, mas perigosa: “Se os dados já estão na internet, por que se preocupar em regulá-los?” Essa postura minimiza os efeitos negativos do uso não consentido de dados pessoais — inclusive sensíveis —, e desconsidera os riscos reais de discriminação algorítmica, vazamentos, manipulação comportamental e vigilância em massa.
A crítica legítima a pontos específicos do projeto é não apenas bem-vinda como necessária — é assim que se melhora uma proposta legislativa. No episódio de hoje vamos discutir como a proliferação de narrativas intransigentes e desinformativas impede o amadurecimento do debate público e desvia o foco do que realmente importa: construir uma regulação democrática, baseada em evidências, que posicione o Brasil como um protagonista global na adoção responsável da inteligência artificial. Vem com a gente!